ESPECIAL AFRICANIDADES (PARTE 2): 5 atividades para valorização da cultura afro-brasileira


    Seguindo a proposta para o mês de Novembro, o Desordem Natural continua com a série de posts ESPECIAL AFRICANIDADES. Nesta segunda parte, cinco sugestões de atividades foram reunidas para aplicar com os alunos até o fim do mês. O grande objetivo dessas práticas é a valorização da cultura afro-brasileira. Atividades em sala, jogos, músicas e dinâmicas para compor o planejamento, enriquecer algum projeto e ampliar o repertório dos profissionais da Educação. Boa leitura!

    Por mais que falamos e buscamos ainda há pouco material de fácil acesso para trabalharmos as relações étnico-raciais na escola, especialmente quando o assunto é afrobrasilidades e africanidades. Os livros didáticos ainda carecem de conteúdos mais reflexivos sobre a questão. Para tanto, investiguei alguns materiais a que tive acesso e produzi esta lista com as atividades abaixo. Um dos grandes objetivos deste blog é a ampliação de repertório. 
    Sei bem como estão nossas cabeças nesta época do ano (reta final com mostras pedagógicos, conselhos de classe, fechamento de notas e etc), por isso as atividades abaixo são um pouco mais concisas. Ao final do post, é possível encontrar as fontes de onde retirei o conteúdo para quem quiser se aprofundar mais na questão. Vamos lá, então?

1. Canção "ÁFRICA" - Palavra Cantada

   
   Uma boa pedida para "começar os trabalhos" pode ser esta canção da conceituadíssima banda Palavra Cantada. Não conheço melhor canção que reúne qualidade musical e uma linguagem muito interessante e clara para as crianças. São muitas informações que abrem inúmeras possibilidades de estudos. 
     Acredito que os versos do refrão (Entre Oriente e Ocidente/ Onde fica?/ Qual a origem da gente?/ Onde fica?/ África fica no meio do mapa do mundo do Atras da vida...) já disparam uma atividade de Geografia ou História para situar os alunos. Pedir que consultem no Atlas o continente africano, bem como os países que são citados. Possivelmente eles questionarão sobre os países de outro continente que surgem também, e aí pode-se entrar com reflexão para analisar a letra (Todo o povo do Japão saberá). Os elementos históricos que surgem na canção podem ser pesquisados em casa ou nos laboratórios e salas de informática: o que será o Leão de Judá? Por que o povo da Bahia já sabe de onde vem a melodia de Ijexá? Talvez em ciências podemos ver sobre o baobá, importantíssima árvore africana. E a floresta de Oxalá? Quem será Oxalá? Enfim, há muitas possibilidades que a canção permite, ou mesmo uma coreografia pode ser muito interessante!


2. Pinturas rupestres


    Muito trabalhada em outros aspectos a pintura rupestre também tem suas relações com a África e até o Brasil. O interessante, neste momento, é propor as referências africanas e até promover uma reflexão sobre os animais que surgem.
    Os alunos podem observar algumas pinturas de várias regiões do mundo e a partir das evidências que encontram descobrir quais são dos povos africanos. A partir de então observar os traços e como se dão as representações pois eles variam de região para região. Ao fim, dá para expor em murais ou cartazes pela escola. Veja algumas imagens da arte rupestre africana:


Agora, confira os procedimentos nesta sugestão do projeto A cor da cultura:

Atividade: arte africana usando lixa de parede ou papel com areia. 

Materiais: – folhas de lixa de parede – giz de cera de várias cores 

Como fazer: Entregue a cada uma das crianças uma folha de lixa. Peça que desenhem sobre a lixa uma cena, usando giz de cera. O professor pode sugerir que reproduzam momentos do cotidiano, como brincar no recreio, lanchar, fazer uma roda, dormir, representar a família etc. Os desenhos podem ser bem simples. O lápis de cera deve ser pressionado sobre a lixa para dar o efeito de um desenho das cavernas. Depois de terminada a atividade, escolha algumas imagens de pintura rupestre encontradas nos diversos países africanos e no Brasil para mostrar para as crianças. Falar um pouco sobre esta arte que é também uma forma de contar uma história. 
Obs.: o professor deve fazer sua pesquisa sobre o tema. 

Por que: arte, história, representações... Um dos nossos intentos, com esta atividade, é que as crianças se percebam produtoras de imagens e histórias. 

Temas: África; símbolos; memórias. 

Valores civilizatórios afro-brasileiros: ancestralidade — memória — circularidade

3. Mapas do Brasil e África decorados


    Relacionar o continente africano com nosso país deve ser uma reflexão muito proveitosa. Esta proposta do Projeto A cor da cultura é muito legal pois traz o uso de sementes e outros materiais que podem dar uma estética que possibilita diversas questões: O que temos em comum com a África? Por quê? Veja só como o projeto sugere:

Materiais: - Sementes, folhas, areia, tinta colorida, tampinhas, recortes, grãos (feijão, macarrão), pincéis, embalagens para recortar. - 2 folhas de papel kraft grande (66 x 96) com os contornos dos mapas da África e do Brasil desenhados — veja o desenho para fazer a reprodução do contorno. 

Como fazer: prepare os dois painéis em papel kraft com o contorno dos mapas. Escolha dois grupos na turma. Cada um deles trabalhará num dos mapas. Coloque os mapas no chão, no centro de cada grupo. Deixe todos os materiais disponíveis para a decoração dos mapas. Peça para os grupos decorarem os mapas com os materiais fornecidos, de forma que fiquem bem coloridos e com textura para mostrar a riqueza das culturas africana e brasileira. Durante a atividade, converse sobre todos os valores que foram “trocados” neste processo de imigração. Tomando como base os mapas do Brasil e da África, fale sobre a vinda dos escravos africanos. Mostrar, nos mapas, as regiões da África de onde eles saíram e as regiões do Brasil onde aportaram. Falar um pouco sobre esta imigração. Por que: esta atividade favorece, ou pode favorecer, uma imersão inicial nas relações Brasil–África, acionando e construindo memórias (táteis, visuais, afetivas...). 

Temas: África; diversidade humana; memórias; valores civilizató- rios afro-brasileiros. 

Valores civilizatórios afro-brasileiros: circularidade — memória — territorialidade

4. Bonecas Abayomi


    Uma herança cultural fantástica e que os alunos precisam conhecer! As bonecas abayomis registram a época da escravidão quando presos aos navios, as mães africanas preocupadas com suas crianças confeccionavam as bonecas a partir das barras de suas saias. Elas arrancavam as tiras de tecidos e com nós e tranças faziam os brinquedos para os pequenos. São sempre pretas e não possuem nenhuma costura. Abayomi vem do dialeto iorubá e significa "encontro feliz". Esta era uma das estratégias das mães africanas de acalentarem seus filhos. Esta atividade deve ser proposta para as crianças sempre abordando sua origem e seus significados. Presentar alguém com uma dessas bonecas é uma demonstração de afeto e carinho. Veja o passo-a-passo que o site Maped oferece e em seguida, há um tutorial em vídeo do canal da Elaine P. A. S. Lara. Simples, lindo e rico!


Agora, veja o vídeo:


5. Jogo: Guerreiros Nagô


    A última dica é uma brincadeira muito conhecida pelas pessoas e muito tradicional na escola, no entanto, aqui conheceremos a versão mais próxima da original desta brincadeira. "Guerreiros Nagô" na verdade é a origem de "Escravos de Jó". 
    Segundo estudiosos este jogo foi radicalmente alterado em sua forma de cantar e brincar pelos colonizadores ao perceberem que a brincadeira realizada pelos africanos escravizados, na verdade, era uma estratégia de fuga. A canção original era mais ou menos assim:
Guerreiros Nagô
Jogavam Caxangá
Salta! Gira!
Deixa o Zabelê ficar
Guerreiros com guerreiros
Fazem zigue zigue zá! 
Guerreiros com guerreiros
Fazem zigue zigue zá! 

    O ritmo foi mantido, mas dá para se observar as trocas de palavras. Vejam: "Guerreiros Nagô" exaltava a força que tinham em seu continente, foi substituído por "Escravos de Jó", o que sugere uma submissão enorme. "Salta! Gira!" tiveram no lugar "Tira! Põe!" porque o jogo era em pé numa grande dança e roda. Com as alterações passou a ser em uma roda com todos sentados em movimentos mecânicos. Zabelê é um nome próprio. No lugar de Zabelê poderia ser dito o nome de qualquer um do grupo. Quem ouvisse seu nome no jogo deveria fugir no momento do "zigue zigue zá", pois nessa hora todos trocavam de lugar em uma grande correria e deixaria o fugitivo livre para não ser percebido. 
    Ao perceber a artimanha dos escravos, o homem branco na situação de opressor mudou as regras do jogo. Colocou todos sentados passando sementes um para os outros representando o trabalho. Esta é a versão que conhecemos. Hoje podemos levar este conhecimento aos alunos e, primeiramente, contamos esta história e depois brincamos. Veja como:
  1. Todos em roda. Nos dois primeiros versos vão andar e dançar no sentido horário da roda.
  2. Na hora do "Salta! Gira" todos devem dar um salto e girar no lugar.
  3. No quarto verso, o nome de alguém será dito. Todos devem saber que se alguém ouvir seu nome durante a música deverá correr e sair da roda durante o "Zigue zigue zá".
  4. Quando cantamos "Guerreiros com guerreiros", um jogador vira de frente para o outro e simula uma luta.
  5. No "Zigue zigue zá" todos devem correr para outro lugar passando pelo meio da roda e quem teve seu nome dito deve fugir.
    A brincadeira tradicional dos "Escravos de Jó" pode ser mantida e executada, mas é importantíssimo que os alunos conheçam esta versão originária e comecem a ter uma visão crítica dessas mudanças. Afinal, trabalhar africanidades e as relações étnico-raciais vai além do lúdico. O objetivo lá na frente é desenvolver o pensamento crítico das questões culturais e históricas para então, evitarmos o racismo e as discriminações culturais.
*   *   *

    Bem, estas foram apenas cinco atividades que reuni neste post para colaborar com as práticas deste mês. Espero que tenham gostado e possam aproveitar o conteúdo!
    O próximo post da série será sobre canções que abordam as relações étnico-raciais de uma maneira mais crítica.
    As atividades que sugeri e me referi ao Projeto A Cor da Cultura foram retirados do excelente material divulgado pelo projeto. Você pode ter acesso gratuito e conferir muito mais coisas clicando aqui!
    
Esses e outros abraços!

5 comentários

  1. Oi, parabéns. Só uma dúvida: vc tem alguma referência bibliográfica da brincadeira Escravos de Jó, nessa "nova" versão ? Abraço

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  2. INCRIVEL!!! Eu sabia que existia outra versão, mas fiquei bem feliz ao saber a origem. Sempre achei a cantiga "Escravos de jó" muito submissa, sem representatividade. Guerreiros Nagô faz sentido! Sou grata por este conhecimento.

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  3. Fiquei encantada com a página e as sugestões de atividades... Adorei conhecer a origem da cantiga "Escravos de Jó"...

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  4. Saudações a todos, todas e todes os educadores que pesquisam para levar o conhecimento às nossas crianças e jovens. Muito importante conhecer as fontes do que vamos transmitir, por mais louvável que sejam, as histórias da abayomi e do guerreiros nagô, não remetem a huma fonte segura.
    Sobre a verdadeira história das bonecas abayomi:https://www.conexaolusofona.org/bonecas-abayomi-por-que-a-origem-romantizada-dura-mais/

    Sobre a brincadeira escravos de jó: https://super.abril.com.br/historia/jo-nao-tinha-escravos-e-ninguem-joga-caxanga/#:~:text=Mas%20a%20letra%20%C3%A9%20uma,o%20paciente%20J%C3%B3%20tivesse%20escravos.&text=Aparentemente%2C%20a%20letra%20foi%20t%C3%A3o,tempo%20que%20perdeu%20o%20sentido.

    Faço um apelo a todes vocês, busquemos as fontes.

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    1. Muito importante todo mundo saber da verdadeira história da Abayomi

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